No post “Acredite: Agilidade, e o Scrum em particular, não são somente para uma equipe de craques”  eu apresentei um debate entre dois autores onde em “Limitações do Desenvolvimento Ágil de Projetos” o autor elenca 6 objeções à Agilidade. Por isso eu apelidei esse artigo de “A Acusação”. Já em “A Causa Contra Agilidade: 10 Objeções Gerenciais Perenes” o autor contrapõe todos os argumentos da Acusação, acrescentado mais quatro. Por isso eu apelidei o segundo artigo de “A Defesa”. A primeira objeção discutida referiu-se ao mito de que Agilidade é somente para equipes constituídas exclusivamente de profissionais competentes.

 

No post de hoje eu abordarei a segunda objeção, que consiste em que implementar Agilidade depende da cultura organizacional. No julgamento dessa objeção seguirei o mesmo roteiro. Apresentarei os argumentos da Acusação, seguirei elencando os contrapontos da Defesa, ampliarei a discussão com dados tangíveis e concluirei com as palavras de um craque para dar o veredito.

 

A Acusação levanta a bola de que Agilidade adapta-se melhor em organizações onde:

 

  1. As responsabilidades das pessoas não estão bem definidas, ou, nas palavras do autor, naquelas organizações onde a “descrição de cargos é ampla”;
  2. Os processos são definidos por cada equipe de forma independente;
  3. Inexiste um manual com políticas da organização; e
  4. Os processos são secundários em relação às pessoas.

 

A Acusação continua seu discurso afirmando que Agilidade requer muita liberdade tanto para o indivíduo como para as equipes. Segundo ela isso leva a uma constante mudança tanto na forma de trabalhar (ou seja, nos processos) como no papel que as pessoas exercem no desenvolvimento de um projeto. Com essa argumentação ela induz o leitor a acreditar que Agilidade não se encaixa em organizações onde:

 

  1. A descrição de cargos define as responsabilidades de cada indivíduo;
  2. Existe uma metodologia explícita para o desenvolvimento de projetos de todos os tamanhos;
  3. Políticas organizacionais devem ser respeitadas para permitir controles; e
  4. Respeito à hierarquia é chave para o sucesso de uma organização;
     

Ela estereotipa alegando que Agilidade cai bem em empresas que estão começando suas atividades, normalmente com produtos ou serviços inovadores e que não cai bem em empresas grandes e bem estabelecidas onde a observância à burocracia e à hierarquia são fundamentais para o controle e consequente sucesso organizacional.

 

A Defesa, por sua vez, contrapõe, afirmando que para sobreviver no mercado atual as necessidades dos clientes devem estar à frente da burocracia e que um ambiente de trabalho adaptável a mudanças é fundamental para atender às mencionadas necessidades. Essa é a chave para o sucesso organizacional. Ponto para a Defesa!

 

Entretanto a Defesa conclui que se a cultura organizacional não se adapta à Agilidade então deve-se mudar a cultura. Lamentavelmente a Defesa não diz como mudar essa cultura… Mas existe uma coisa muito pior do que essa omissão. A Defesa, nesse ponto, está errada!

 

Para implementar Agilidade não é necessária transformar uma grande empresa, ou qualquer empresa estabelecida, em uma “start-up”. No livro “Papéis do Scrum: Porcas, Parafusos e as Origens de um Framework Ágil”  os cocriadores do Scrum, Jeff Sutherland e Ken Schwaber, descrevem como empresas grandes como a Google, Microsoft, Lockheed Martin, SAP, CISCO, GE e US Federal Reserve utilizaram o Scrum para desenvolverem grandes projetos constituídos de várias equipes Scrum, totalizando mais de 1500 pessoas distribuídas geograficamente. Eu não conheço essas empresas e menos ainda os projetos mencionados, mas acredite, caro leitor ou leitora, que todas elas têm em menor ou maior grau todos os 4 itens que a Acusação descreve como não adequados à implementação do Scrum.

 

A Acusação, por sua vez, comente um grande erro. O de afirmar coisas baseadas em crenças e não em fatos. Em uma rápida pesquisa utilizando o Google encontrei o artigo “Scrum e o CMMI Nível 5: A Poção Mágica dos Guerreiros da Programação”.

 

Antes de prosseguir é necessário descrever que o CMMI consiste num modelo de maturidade, desenvolvido pela Universidade Carnegie Mellon que ajuda as organizações no objetivo de aperfeiçoar seus processos, visando a contínua melhoria do seu desempenho. Para alcançar o Nível 5 (que é o maior) as empresas precisam ter seus processos definidos e gerenciados para então focarem na melhoria contínua. Uma certificação dessa requer tempo, burocracia e dinheiro (a Acusação não fala nada sobre dinheiro). Mas esses não são atributos que inviabilizam a implementação de metodologia ágil em uma organização, segundo a Acusação?

 

Voltando ao artigo, os autores concluem que: “projetos que combinam métodos ágeis com CMMI são mais bem sucedidos em produzir software com mais qualidade e que mais efetivamente atendem as necessidades dos clientes em uma velocidade maior”; que “…a produtividade das equipes Scrum foi quase o dobro da produtividade das equipes tradicionais”; e que “…utilizando uma abordagem de teste baseada em histórias para o desenvolvimento de software reduziu os defeitos encontrados nos testes finais do um projeto em 40%”.

 

A minha conclusão, baseada tanto na literatura quanto na minha experiência, é a de que a implementação de metodologia ágil requer coragem, vontade e determinação dos líderes de uma organização. Os aspectos culturais, em particular as crenças que levam às objeções, se esvaem com os resultados obtidos. Mas processos, políticas e definição de responsabilidades não são incompatíveis com metodologias ágeis e em particular com o Scrum.

 

Um forte abraço e até o próximo post!